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A tecnologia sustentável que quer atacar o desperdício alimentar

  • Writer: UCD
    UCD
  • Mar 28
  • 4 min read

Updated: 2 days ago

No nono piso da Torre Sul do Instituto Superior Técnico, em Lisboa, está a ser ‘fermentado’ um projeto de investigação que uniu vários países. O objetivo é produzir uma tecnologia de conservação de alimentos que seja, em semelhante proporção, mais sustentável, mais amiga da saúde humana, mais eficiente e que também faça descer os números do desperdício alimentar. O DH Lab foi conhecer este projeto de investigação, liderado pela Professora Filipa Ribeiro, que espera agora pelo parceiro certo para escalar a solução desenvolvida. Venha connosco nesta viagem.




Foi nos labirínticos corredores da Torre Sul do Instituto Superior Técnico que conhecemos Filipa Ribeiro, Professora catedrática em Engenharia Química e responsável pelo projeto Nano4Fresh. O projeto, que o DH LAB foi conhecer, terminou no final do ano passado e foi o resultado de anos de investigação conjunta entre Portugal, Espanha, Marrocos e Itália.

No seu gabinete, rodeada por equipamentos de pesquisa, frascos de zeólitos e livros, Filipa Ribeiro explicou-nos a motivação por detrás do Nano4Fresh: combater o desperdício alimentar. “Uma das principais estratégias para prolongar a vida útil dos alimentos, mais precisamente das frutas climatérias, é o armazenamento refrigerado com atmosfera controlada”, esclarece a investigadora.


No entanto, apesar das condições que retardam a maturação, os frutas armazenadas nessas câmaras são expostos a gases produzidos no seu interior, como o etileno, um composto químico que acelera o amadurecimento das frutas e que muitas vezes acelera o processo de putrefação, obrigando a desperdício desnecessário.


O desafio do Etileno

O etileno é um gás natural produzido por frutas e vegetais durante o processo de maturação. Quando libertado no ambiente, estimula o amadurecimento acelerado das frutas à sua volta, levando à sua deterioração mais rápida. “Foi precisamente esse problema que quisemos resolver”, afirma Filipa Ribeiro.


A ideia do Nano4Fresh surgiu, assim, em 2018, fruto de uma colaboração com uma equipa espanhola. “Queríamos criar um projeto que combinasse as nossas áreas de especialização. A equipa espanhola trabalha com carvões e nós, em Portugal, especializamo-nos em zeólitos, materiais altamente porosos capazes de adsorver substâncias específicas”, explica a cientista.


Desenvolvido em consórcio com Marrocos e Itália também, o Nano4Fresh materializou-se num sistema prototipado que ‘ataca’ o etileno, na prática, capturando-o. E como? Através de Zeólitos, um material em tudo semelhante a minúsculos pellets que têm o poder de ‘limpar’ o etileno de camaras refrigeradas.


O poder dos Zeólitos

Mas como funciona esta inovação? “O que desenvolvemos foi um protótipo capaz de remover o etileno do ar no interior das câmaras de conservação, reduzindo drasticamente a sua concentração e, assim, atrasando o amadurecimento das frutas”, revela a investigadora.


O sistema criado pelo Nano4Fresh consiste num dispositivo que extrai o ar da câmara de refrigeração, faz a sua passagem através de um leito de zeólitos que captura o etileno e devolve o ar purificado ao ambiente interno. Este ciclo contínuo permite manter a fruta fresca por períodos significativamente mais longos.


“A nossa tecnologia consegue reduzir os níveis de etileno em mais de 90%, o que significa que as frutas amadurecem muito mais lentamente – ou, idealmente, não amadurecem de todo até serem retiradas da câmara”, esclarece Filipa Ribeiro.


Este processo é, como nos explica a Professora Catedrática do IST, fundamental para a conservação de frutos climatéricos, como a banana, a maçã, a Pêra Rocha e o kiwi, que produzem grandes quantidades de etileno e, se não forem devidamente armazenados, acabam por acelerar o amadurecimento uns dos outros.


Uma alternativa sustentávelAtualmente, uma das soluções utilizadas no mercado para evitar o amadurecimento precoce das frutas é a aplicação de compostos químicos como o 1-MCP (1-metilciclopropeno), um composto que bloqueia os recetores de etileno dentro da fruta. No entanto, a longo prazo, os efeitos deste tipo de tratamento ainda não são completamente conhecidos.


“Nós queríamos uma solução totalmente física, sem introdução de químicos nas frutas”, sublinha Filipa Ribeiro. “O nosso sistema utiliza um sólido adsorvente – os zeólitos – que retêm o etileno sem entrar em contacto direto com os alimentos”, sistematiza.


Além disso, há uma outra particularidade interessante. É que este material pode ser facilmente regenerado e entrar num novo ciclo de vida através de um ligeiro aquecimento, tornando-se reutilizável e mais económico a longo prazo do que os sistemas atualmente utilizados.


O teste do algodão… com a Pêra RochaPara validar a tecnologia em condições reais, a equipa do Nano4Fresh estabeleceu uma parceria de colaboração com o Rocha Center, um laboratório para estudos pós-colheita e tecnologias para conservação da Pêra Rocha, situada no Bombarral.


“No nosso estudo, testámos o sistema numa câmara de refrigeração onde estavam armazenadas Pêras Rocha, um dos frutos que mais beneficia desta tecnologia”, explica Filipa Ribeiro. Os resultados foram impressionantes.


Sendo este um fruto que é colhido em setembro, mas precisa de ser armazenado durante quase um ano para garantir que está disponível nos supermercados ao longo do tempo, a tecnologia da Nano4Fresch permitiu “que a fruta mantenha as suas características organolépticas – sabor, textura e aroma – sem a necessidade de adicionar químicos.”


Além do armazenamento de longo prazo, em camaras frigoríficas, a tecnologia do Nano4Fresh pode ser aplicada em supermercados, centros de distribuição, até no transporte de frutas importadas, mas, quem sabe, no futuro, também nos frigoríficos das casas dos consumidores.


“Muitas frutas são colhidas em locais distantes e transportadas em contentores por semanas. O controlo do etileno nesses espaços pode fazer toda a diferença na qualidade do produto final”, acrescenta a investigadora.


Do laboratório para o mercado

Agora que a investigação foi concluída, qual o próximo passo? Filipa Ribeiro revela que o Nano4Fresh está na fase final de validação e patenteação, e que a equipa já iniciou contactos com empresas do setor agrícola e da distribuição alimentar, que poderão beneficiar da tecnologia, a qual denominaram FreshIST. O FreshIST tem vindo a criar asas em diversas iniciativas de aceleração de inovação, como o Lab2Market promovido pelo Instituto superior Técnico.


“Queremos ver esta inovação no mercado. Ainda há alguns testes a realizar, mas acreditamos que este protótipo pode revolucionar a forma como conservamos frutas e reduzir drasticamente o desperdício alimentar”, conclui a investigadora.

Com uma solução sustentável, sem químicos e altamente eficaz, o Nano4Fresh poderá ser um ‘game changer’ no combate ao desperdício alimentar no setor agrícola, garantindo frutas mais frescas, por mais tempo, sem comprometer a sua qualidade ou segurança.


Jornalista: Sérgio Abrantes | Fotografia: Rodrigo Cabrita



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